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quarta-feira, 29 de maio de 2019

Em busca da terra da abundância: Padre Angelo Cavalli 140 anos depois

Em busca da terra da abundância, centenas de vicentinos da Valbrenta e seus arredores deixaram suas pequenas cidades, em 1877, para vir ao Paranà, no sul do Brasil. A promessa veio de Pe. Angelo Cavalli, pároco de Oliero, um vilarejo de Valstagna.

Suas famílias eram numerosas, com pouca terra para cultivar e muitas pessoas para sustentar. Emigrar era visto como a única solução para escapar de um Vêneto pobre e que, infelizmente, naquele período não poderia oferecer novas oportunidades para o seu povo.

Segundo o livro Memórias de um imigrante italiano, de Giulio Lorenzoni, Pe. Angelo Cavalli fascinou os camponeses com suas palavras, comparando o Brasil à terra prometida. Como líder espiritual, seu discurso encorajou muitas famílias a vender o pouco que tinham para comprar as passagens e emigrar para um lugar onde pudessem ser patrões de si mesmos. Uma casa, terra com pagamento a longo prazo, ferramentas de trabalho e sementes foram prometidos pelo governo brasileiro.

Nem todos eram a favor de Pe. Angelo, nem mesmo a Igreja, que reteve suas ordens de celebrar as missas antes desta epopeia. Também porque, como Chiara Cucchini relata em sua monografia, houve algumas acusações contra ele, como a do ganho na organização de documentos e da viagem de seus paroquianos como agente de emigração clandestina. Foi considerado, como nos lembra Pe. Franco Signori, em um de seus artigos, um corretor de carne humana.

A escritora brasileira, Susete Moletta, que há muito tempo vive em Bassano del Grappa, dedicou várias páginas de seu livro, Da Itália para o Brasil: o casal de Capelinha de Água Verde, a sua figura. Moletta conseguiu reconstruir uma lista de setecentas e vinte pessoas que chegaram ao Paranà sob os cuidados de Pe. Cavalli.


Illustrazione di Chiara Bertolin

A chegada deste grupo ocorreu entre os dias 15 e 17 de novembro de 1877 e se instalou em Morretes, na colônia Nova Itália. O descontentamento dos imigrantes começou assim que eles chegaram, porque todos foram colocados juntos em um galpão. Suas casas que foram prometidas ainda não estavam prontas. As condições climáticas do local e a falta de assistência do governo foram consideráveis.

Em dezembro de 1877, Pe. Cavalli assinou um contrato com o governo do Paraná para se tornar o capelão da colônia. Mas em maio do ano seguinte, o governo publicou o seu afastamento do cargo, porque não havia recebido a carta do Bispo de Pádua comprovando que ele era sacerdote. Outro pedido de análise de sua situação foi enviado em junho de 1878. Este também não foi bem sucedido e, portanto, nenhuma atribuição oficial para o cuidado dos imigrantes foi confiada a Pe. Angelo Cavalli.

Um jornal de Curitiba o acusou, juntamente com o agrimensor Ernesto Guaita, de enganar os camponeses por ganhos financeiros enquanto buscavam novas terras na área de Piraquara. Neste momento, Pe. Angelo Cavalli desapareceu.

Os imigrantes, deixados sozinhos, mudaram-se para o planalto de Curitiba e o governo os realocou em novas colônias fundadas a partir de setembro de 1878. Estas se concentraram em torno da capital paranaense, como a colônia Alfredo Chaves (hoje o centro de Colombo), Rebouças (Campo Largo) e Santa Felicidade, que se estabeleceu como uma colônia privada. Além destes, nasceu também, no mesmo período, a Colonia Dantas (Água Verde), por iniciativa do município de Curitiba.

Pe. Angelo Cavalli foi responsável pelo movimento transoceânico de centenas de camponeses. Por que então a figura dele não é lembrada? Mesmo entre os descendentes de sua família, que ainda moram em Colombo, nunca se ouve falar dele. Por que foi apagado da memória coletiva?

Insatisfeito com esse esquecimento, decidi seguir alguns traços de uma história que ouvi algumas vezes de algumas famílias em Colombo que falavam de um padre. Um padre que havia enganado seus antepassados quando eles chegaram ao Brasil e depois desapareceu com o dinheiro deles. No entanto, as famílias não sabiam seu nome. Sem me preocupar se era ou não a mesma figura, percebi que tinha que investigar. Eu queria conhecer mais sobre a história dele e, para isso, teria que estender as buscas para além do Paraná.

Após longas pesquisas na Hemeroteca, consultando jornais brasileiros, finalmente encontrei sua história. Em agosto de 1878, Pe. Angelo Cavalli se mudou para o Rio de Janeiro, onde tentou novamente ter sua autorização para celebrar missas e mais uma vez não obteve sucesso.

Em 29 de maio de 1879, ele morreu de febre amarela, no Rio de Janeiro, no Hospício de Jerusalém, onde provavelmente estava sendo tratado. Foi enterrado no mesmo dia no Cemitério São João Batista.

Fazer memória da figura mítica de Pe. Angelo Cavalli significa recuperar os vestígios que o tempo nos deixou. Nós nunca saberemos se realmente foi ele quem enganou as pessoas e fugiu com o dinheiro delas. O que sabemos com certeza é que suas promessas não foram cumpridas. Portanto, mantemos na história a dicotomia de sua figura entre salvador e ludibriador.

O que realmente importa é que a coragem e a destreza de nossos antepassados vênetos se sobrepõem a isso e se tornam eternamente memoráveis.

Autor do texto: Diego Gabardo

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